sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O SORRISO DA BORBOLETA

Dedico tudo quando fiz até hoje, quer escrito pensado ou sentido a todos os que me amaram, pensaram que me amaram ou simplesmente me aceitaram. Faço esta oferenda sem altar nem vestais, usando apenas o fogo da obstinação e da teimosia, forças que carrego e alimento para viver.Poderia ter-te esperado para somente a ti falar sobre borboletas coloridas sorrindo no meu sorriso, afastando morcegos sombrios misteriosos em vôos cegos nas tardes que morrem enquanto tento viver. É assim nos meu sonhos, tudo voa, tudo brilha, tudo é vida.Bem poderias ter esperado para ver os meus sorrisos, ouvir as gargalhadas e passar comigo pela ponte sobre o rio jogando sobre as águas nossas sombras cruzadas, e as palavras sufocadas na emoção dos sentidos. De que palavras falei? Já nem lembro. Sei apenas que fui feliz. Bem que eu poderia ter te esperado para me ajudares nas escolhas. Se me perguntares, quais, também não saberei dizer. Na verdade, nunca soube de nada além do meu sorriso.Quando a noite se veste de eclipse e apaga a luz nos meus olhos eu te quero, aqui, bem aqui, para sugares a seiva adocicada na maciez do meu rosto e, com ela, alimentar nossos sentidos. Ah! Por que não esperaste? Por que me dividiste em duas metades tão diferentes?O que me atrapalha a vida é viver. Não me preparei para ela. Vivo de improvisações. De manhã tenho que inventar um novo dia. Surpresas confusas diante dos meus olhos. Nunca sei qual o próximo passo. Alguns, pontos finais, outros, reticências, geralmente interrogações protelando as respostas. O que me atrapalha o sonho, é sonhar. Quando é apenas uma palavra é só uma ameaça, desejos são incógnitas, tragédias, comédias ou paródias. Apenas um sopro de ansiedade que, quase sempre, se transforma em pesadelo.O que estraga minha crença, é acreditar, acreditar no que vejo e no que gostaria de ver.No abismo das manhãs, imagens, sons, gemidos, estruturas de ferro que me prendem ao incognoscível.De muitos sentimentos é feita esta confusão. Estradas, rios, cachoeiras, mares sol, lua. Tudo quando cabe no mundo cabe nos meus olhos. Só consigo ser simples quando decomponho minha alma nos espelhos partidos. Deixo de lado a minha infância para não manchar a brancura dos véus.Vamos, escreva, digo à minha mão. Vamos, pense, ordeno ao pensamento. Não posso nunca dizer ao coração – esqueça. Cheio de um sopro de vida toma conta das minhas pulsações e, em confusas batidas, ameaça parar.O mesmo sorriso que vai já não é o mesmo que vem. O olhar que olha de lá vê o quê? Enquanto este mistério atravessar ruas e pontes continuo a conceber rostos estranhos que vêem e voltam sem trocar a pele. Será que a intenção ultrapassa a idéia?Minha força está na descrença. O que seria de mim se acreditasse em tudo sem contestar, sem desobedecer? Seria apenas uma alma bem comportada a caminho do céu. Não aprenderia nada. Ganharia asas coloridas para voar do lado de lá. A contestação me entrega a verdade. Fico por aqui mesmo. Quer saber? Duvide. Não da verdade que lhe impõem, mas da sua verdade induzida e aprisionada. Não creio que tenha dito alguma coisa impudente, mas o que eu disse me mantém descrente de minhas irresoluções.Os rumores do silêncio me amedrontam quando me chamam com a voz do medo, dissimulada no silêncio das assombrações. Descasco a maçã e me desfaço das sementes. A água tem sabor de veneno nestes lábios feridos, ameaçados pela verdade. Minha força está no sofrimento. Sei sofrer. Fingir felicidade.Quando meu tempo terminar não mais serei a mesma apenas um arremedo da mulher que atravessou a vida na contra mão.A palavra, seja ela qual for, se transfigura nos labirintos do pensamento – se escrever vadia, troco uma letra e ficará vazia. Se chamo Marta a letra trocada me entregará morta. Se troco a letra do meu medo ele ficará mudo.Letras infiéis sobre o altar de um sonho convulso nas ondas da concupiscência, palavra cruel que dissimula o desejo.Escrevo porque falar me cansa.Se ninguém ler o que escrevo ninguém saberá que existo.